O poema te procura,
Remota ânsia,
Matéria escura;
Sons andarilhos.
Sino de faiança,
Chamado estranho
À tua vizinhança.
O poema concentra,
A tua distância
Na cela acesa,
Sol amparado,
Céu reduzido,
Vôo simulado
De ave presa.
O poema te arma,
És sentinela,
A mão na faca
Atrás da porta;
Hirto, velas,
No próprio pulso
As horas cortas.
O poema te detém
Remotamente,
Grato refém
Desse exercício,
Louca assistência:
Içar palavras
Suicidadas
No precipício
Da existência.
CYCLADES
A mesma folha
Enche-se de ilhas,
Uma, duas, cem.
Logo está saturada
De Cyclades
Flutuantes
Sobre abismo branco:
Uns tantos destroços vulcânicos
Coagulados.
Nada afunda
E nada se fundamenta.
Nenhum navio transita.
Não há naufrágios.
AFASTAMENTO
Com carvão desenho um perfil na tela.
É todo um ser de proximidades.
Recuo alguns passos:
O entorno enquadra o quadro.
Mais alguns passos para trás:
O entorno do entorno o engole.
Recuando ainda mais:
O entorno do entorno do entorno
Toma tudo para si:
Já não vejo o que pretendera representar.
Magritte, A Condição Humana, OST, 1933 |