Como ter a disponibilidade criativa e lúdica de um anônimo construtor de castelos de cartas que se submete apenas às injunções do próprio medo (sagrado medo!) de que eles desabem diante dos seus próprios olhos?

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

PEQUENOS POEMAS




FÍSICA

Gostava de aplicar
a expressão vasos comunicantes
aos nossos olhos,
nossos ouvidos,
nossos sorrisos miscíveis
e ao nível comum de nós
à altura das nossas bocas.



NEFELIBATAS

Alguns estão nas nuvens
para fincar uma bandeira,
símbolo territorial,
neste solo vaporoso.
Quanto a mim, encontro-me aqui
apenas para agitar
a minha perplexa flâmula.




À BASE DE ÁGUA

Tu choras, e a minha consciência
é diluída:
enorme pastilha de aquarela
de onde extrais
pesados tons de cinza.



CHAPLINIANO

Fim de filme.
A estrada por seguir.
Música nostálgica, triste.

Sem efeitos especiais,
a minha bengala
e o meu chapéu-coco
flutuam e seguem em frente
na ausência do meu corpo.



AO ALCANCE DOS OLHOS

Não sei reconhecer lírios
ao vivo,
pois só os vi
na enciclopédia lírica.

Queria que fossem eles
essas flores tão banais
nas janelas da vizinhança.



NÃO BRUNIR

A pátina é mais bonita
porque é acúmulo
e tem história.
O brilho, não:
é só de agora.



DIVERTISIMENT

O céu chorou?
Que grandes pálpebras terá!
A tomar pelo tamanho
do arco da íris...



LE DÉJEUNER SUR L'HERBE

Inclina-te
e pega uma fruta
na natureza-morta
para que pareças
ainda mais natural.
                                                                                                                                        

7 comentários:

  1. Até o clima aqui deste blog me agrada.

    Beijo.

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  2. Vige! Desculpe, Marcantonio, mas sempre fico sem graça pra comentar...

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  3. Rapaz, essa corredeira de pequenos poemas com que você vem alagando meus ouvidos faz algum tempo repinica nos meus tímpanos como balas perdidas de Cosme e Damião num filme de Tarantino produzido pelos Estúdios Disney. Mudou o Tarantino? Mudou o Diney? Ou sou eu que tó enferrujando com tanta água forte e não sei mais mudar. A par do prazer que esses enormes pequenos poemas me proporcionam, me dói por todo o meu corpo umas pontadas tão fundas que já me ultrapassam e vem gerando queixas de todos os meus vizinhos de baixo. A continuar assim, o jeito será me deixar afundar nesas águas para afógá-los todos por osmose dcompulsória, irrecorrível. Que algum bem bem mal ou algum mal bem bem disso advenha, redimindo a todos num fragoroso naufrágio profilático. Quem viver, virá!

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  4. Clapt, clapt, clapt!! Poemas preciosos, Marco!

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  5. DIVERTISIMENT

    O céu chorou?
    Que grandes pálpebras terá!
    A tomar pelo tamanho
    do arco da íris...

    Simples e absolutamente belo!

    Bjos

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  6. caraca

    jóias em quartzo

    belíssimo colar

    reverências

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  7. TODA vez que eu me deparo com algo realmente bom, tipo a tua poesia, eu tenho que cidar D.J.Salinger, no "Apanhador em Campo de Centeio", quando o protagonista dizia que, ao ler um livro bom, tinha vontade de telefonar para o autor. Me dá vontade de telefonar prá você, Marc, e dizer o quanto gostei! Abraços...

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