Como ter a disponibilidade criativa e lúdica de um anônimo construtor de castelos de cartas que se submete apenas às injunções do próprio medo (sagrado medo!) de que eles desabem diante dos seus próprios olhos?

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

UM POEMA HOJE BASTA



É ilegível um livro escritos sobre transparências,
A sobreposição das páginas
Cria escara de rasuras.

A cidade ainda se me revela com segmentos vítreos,
Fachadas translúcidas:
O que há para se ver ainda não está apenas nela,
Paisagem-janela para outra cidade.

E uma cidade que se leia tem de ter opacidade
De osso, de fêmur ou crânio ou pelve;
De gordura coagulada, de leite talhado,
De névoa calcificada. Seus caracteres
São ciumentas presilhas óticas.

Uma cidade que se ame obtura os vão de fuga
Para o olhar
E nele crava o esmalte de seus dentes entalhados.

Uma cidade que se ame é corpo com poros fechados,
E não tem avesso que se veja de outra cidade.
Onde é líquida, também é turva.
Se tem rios, correm em círculos,
Se litorânea, fecha as estradas marítimas da memória
De outras cidades.

Uma cidade que se ame é densa lápide
Para o renascimento
Em que não se chora por futuras saudades.




5 comentários:

  1. O que há para se ver está na cidade de dentro com vista panorâmica para as palavras.

    Ainda por cima, com o vídeo dando o fundo de ansiedade, vi a minha Berlim (todo poeta tem uma Berlim para si).

    ótimo, Marco!!!

    um beijo.

    ResponderExcluir
  2. "Uma cidade que se ame obtura os vão de fuga
    Para o olhar
    E nele crava o esmalte de seus dentes entalhados.[...]"

    Perguntas ainda se 'és poeta'?

    Belíssimo; beijos e abraços.
    El

    ResponderExcluir
  3. corações cidades fechadas

    versos translucidam
    janelas

    abs

    ResponderExcluir