TIRÂNICO
Neste poema instauro
Um despotismo cosmológico:
Com férreo domínio sobre o sol,
Eu o condeno a brilhar para sempre
Nesta página,
Feito áurea roldana
Que aqui içou o esplendor da iluminura,
E em seguida travou-se como mecanismo.
Assim condeno a noite ao ostracismo
Para além da literatura,
Com boca, olhos e ouvidos selados,
Ato poético de ordinária censura.
À NOITINHA
Já ouço os soluços vindos
Do berço da noite.
Ela começa a chorar.
Teria fome de pesadelos?
Todos juntos poderíamos levar aos seus lábios
Um enorme duto
Pelo qual ela sugararia o oceano
Dos nossos medos.
Talvez ela tenha dores no ventre
Inflado de gases nebulosos e astronômicos
Ou farto da loucura, do mal e da morte
Ainda por digerir.
Teria se mirado no espelho côncavo,
Suspenso móbile,
E descoberto ter ela mesma medo de si?
Choro insuportável. Como aguentamos?
Onde estará a mãe da noite?
Dizem que ela tem apenas um pai
Ausente e operoso
Em trabalho eterno no vão entre a luz e a escuridão.
Pobre noite.
Vamos aceitar o encargo de sermos suas babás?
Balancemos seu berço,
Cada qual toque a parte dele
Que lhe chega à janela,
E afinados sussurremos um acalanto:
Dorme...
sexta-feira, 13 de abril de 2012
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Não consigo escrever sem a noite. Às vezes uma ideia poética me consome de dia, e deixo a noite chegar para acalmá-la. Mesmo que a noite chore, ainda me consola. E se ela não dorme nunca, creio que os poetas são os culpados.
ResponderExcluirInteressantes poemas, Marco.
Beijinho.
ô, Marco, não tiraniza a noite... sou como a Lara, sem ela não existo...rs
ResponderExcluirpreciso da boca da noite para dizer todos os nomes...
mas a iluminura já existe nesta página e se chama verso.
a noite nunca dorme? ou os poetas falam japonês?
adorei os poemas
beijo
A noite traz medos, sons difíceis de identificar, tantas vezes. Você humaniza a noite, e talvez isso tenha tudo a ver com o lirismo que ela sugere a tanta gente, em especial os antigos poetas. Mas essa humanização é dura, e olha a noite como um ser que é preciso suportar, cuidar como uma babá. Muito original.
ResponderExcluirBeijo.
A noite é mesmo uma criança. Cuido sempre dela, há décadas e do princípio ao fim. Quando amanhece posso dormir, sempre com a mesma cara de chupeta.
ResponderExcluirAbração
P.S.: Cadê a foto de Davi e Golias?
Eu que sempre sou acolhida no ventre da noite, "viajei" no à noitinha, que vou levar pra mim...:-)
ResponderExcluirBeijos,
Belos e originais poemas. Amo a noite, sondo seus mistérios. É quando o mundo se esfria da luz sufocante do sol que ela se revela.
ResponderExcluirUm beijo, Marco!
Mitze
Nunca pensei que seria a favor de um ato tirânico...
ResponderExcluirAproveitando, deixo aqui um vídeo para xs leitorxs do espaço:
http://vimeo.com/40411264
Oh, que trágico! Acabo de me descobrir viciada nessa geladeira de pesadelos que visito noite sim, noite sim outra vez. E como sofro. Mas pelo menos não me engordo. Talvez, até me emagreça :)
ResponderExcluirbeijosss