Como ter a disponibilidade criativa e lúdica de um anônimo construtor de castelos de cartas que se submete apenas às injunções do próprio medo (sagrado medo!) de que eles desabem diante dos seus próprios olhos?

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

NOVOS POEMAS

ELES

Ah, os especialistas
E suas listas de dogmas.
Ah, os especialistas
E seus dogs raivosos
Em prontidão.
Ah, os especialistas
Com o cu na mão.
Os especialistas
E suas problemáticas
E seus conta-gotas
E sua secura desértica.

Ah, os especialistas
E seu tédio mecânico.
Os especialistas
E sua ignorância
Em pânico.
Os especialistas
E seu vinhos azedos,
Sua contenção urinária,
Seu medo
De sujar as calças raras.
Os especialistas
E seus feudos-segredos.


ASSALTO

É a própria vida
com suas tropas de assalto,
esmurrando a porta:

- Vamos levar algo de ti.

- Não!

- Ordens superiores!

Não me tranqüilizo
pelo saldo de balanço
da esperança:

amanhã eles voltarão
derrubando a porta.


VERBI GRATIA

1- De dentro

Sinto o caos,
Mas não posso descrevê-lo:
Precisaria ter de mim mesmo
A perspectiva do outro.

2- Dormência

Meu sonho entrevado,
em decúbito dorsal,
com escaras
nas asas dormentes.

3- Nunca consumado

Ó filosofia,
eu apenas te bolino
em intermináveis preliminares.

Rembrandt, A Aula da Anatomia do Dr. Tulp, 1632 

19 comentários:

  1. Bravo, caro Marcantonio. Vc transita com facilidade e talento muitas de nossas agonias quase que "coletivas". Belos poemas, meu caro.

    Abraço!

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  2. ah os especialistas com o cu na mão
    e eu de quatro por seus poemas fora de série.

    (minha filosofia é de passarinho, sabe disso)

    beijo, meu mago!

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  3. "Ó filosofia,
    eu apenas te bolino
    em intermináveis preliminares."

    é, meu camarada,
    nessas infindáveis bolinações
    conseguem-se orgasmos múltiplos
    onde as palavras e o silêncio
    chegam às nuvens enlouquecidamente
    ...

    forte abraço,
    grande poeta
    meu amigo.

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  4. Especialistas e seus feudos-segredos! Sensacional! É isso que sinto perante eles. Como é impressionante o fato deles saberem tudo e não saberem nada...
    "Assalto", é praticamente uma denúncia... mas fazê-la a quem? Onde assino?
    Verbi Gratia: 3 obrinhas primas... rs
    Vc é bom demais!
    Beijokas e um lindo fds.

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  5. Ai, ai, ai, ai, ai, Paloma !
    Cucurucu, cucucurucu, cantaba:
    Paloma, no llores!

    beijos :)

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  6. "Ó filosofia,
    eu apenas te bolino
    em intermináveis preliminares."

    Marcantonio, seu platelminto de uma figa. Eu planejara escrever isso logo após o carnaval. Raio de poeta ansioso que me plagia previamente!

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  7. marquinho,
    os especialistas são, em sua grande maioria, ferreiros que tem em casa, espetos de pau.

    ó, o ladrão - qualquer ladrão - quando se vai... ele levou algo de você que ninguém jamais poderá restituir. nem ele. nem Deus.

    e, sim, praticar é quase isto... bolinar folosofias...rs
    ah, sim... sempre a vã des-esperança: um dia eu a fodo.
    com garfo e faca.


    bom final de semana, poeta do azul definitivo.

    r.

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  8. o poema "assalto" pra mim podia ficar só nos três primeiros versos. seria ainda mais excelente!

    abração.

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  9. A preliminar poética é sempre a melhor parte.

    Ótimos e filosóficos poemas, meu caro!

    Beijinho.

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  10. Marcantonio!

    Eles: Perfeito poema que descreve o pânico que os especialistas gostariam de causar em todos, mas há quem tenha paciência para ouvi-los.

    "SINTO O CAOS, MAS NÃO POSSO DESCREVÊ-LO - a perspectiva do outro daria maior segurança.

    Filosofia, teu nome também é Marcantonio.

    Beijos e aplausos!

    Mirze

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  11. Espetacular, estava afim de encontrar mais adjetivos, mas como estes sempre passam, foi ficar apenas com o pleno significado do espetacular. Tenho um poema semelhante ao seu Eles, chamado Desumanos das Humanas, um dia ponho no Sábados. Grande abraço, grande!

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  12. não sei onde exatamente, mas estava discutindo sobre cânone e sua etimologia: vara utilizada como instrumento de medida. e em se tratando de medidas, como diria Millor, eu só confio no meu alfaiate,


    abração

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  13. fabulosas vozes encontro por aqui, dos ecos aos assaltos. belo blog! grata pela visita ao máquina lírica e pelas palavras por lá plantadas.

    abraços!

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  14. Eu detesto os especialistas com seus currículos de lama. Detesto! bj.

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  15. Marco, achei excelentes os poemas. "Eles" é o máximo, porque, além de muito bom poeticamente, ainda canaliza toda a nossa raiva coletiva dos arrogantes especialistas, he he

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  16. No "O apanhador em campo de centeio", o protagonista diz que, quando um livro é muito bom, tem vontade de ligar pro autor. Me dá o teu telefone, Marcantonio? (acho que já fiz esse comentário alhures, mas é vero!)

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  17. Olha que corri pra fecah a porta, tamanha paura que me deu teu verso. A vida vem tomar algo da gente, todo dia, mesmo que seja apenas o tempo de viver.

    E olha, fica nas preliminares, filosofar não é viver....

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  18. Da filosofia a gente só se abeira mesmo, só se abisma, só cisma em interminável amor e labor com nossos lábios, mãos, olhos e ouvidos.

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  19. O mal dos especialistas é que não conseguem fingir, esquecer ou calar - uns chatos.
    Toda porta existe para ser derrubada, por isso usamos tantas trancas.

    Beijo, Marco.

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