ESPERANÇA E MEDO
Você permanece uma manhã brilhante
Engastada no meu peito que entardecia,
Então todos os pássaros do meu mundo
Não fazem senão saudar a sua chegada.
Toda essa seiva de sol sempre nascente,
Inoculada nas minhas veias viciadas
No fluxo mortiço das horas nubladas,
Talvez signifique que este súbito apego
À vida jamais se oxidará no meu corpo.
É por tanto que temo que esse encontro
Embriagado da aurora com o crepúsculo,
Se atire de peito aberto, suicida precoce,
Alucinado, sobre a lâmina afiada da noite.
PLANALTO
Do alto de mim
Observo-me:
Tal servo da terra,
Das coisas.
Do alto de mim
Observo-me:
Severo espectro
Com olho de pássaro
Adicto ao mundo.
Pastor de perguntas
Mancas, erradias,
Desgarradas das trilhas
Dos costumes.
Do alto de mim,
Megafone em punho,
Espantalho de gestos
Desesperados,
Figurante de cenas
Não filmadas,
Locutor de mensagens
Cifradas,
Encenador habitual
De fantasmagorias,
Este que se altera
No alto de mim,
Guarda de trânsito
Multando-me os sonhos
Estacionados
Nas amplas calçadas
Sem transeuntes
Que há sob mim.
SUSPENSÃO DE JUÍZO
Não busco mais definições.
Apenas observo a cortina
Esvoaçando
Contra o frontispício do mundo.
Decididamente não busco mais
Teoremas.
Descuido-me enfim dos adjetivos
Dos pronomes retos, oblíquos
E demonstrativos.
Somos artigos indefinidos:
Eu, tu, ele... Nós? Quem sois vós?
Vozes passivas ou reflexivas,
Expelimos grunhidos.
E o particípio morrendo?
E o gerúndio vivido?
Patéticos,
Nós, postos, opostos,
Ainda recorrendo
Ao superlativo absoluto sintético.
Mas que sujeito ainda se perderia
Na absoluta síntese?
domingo, 6 de fevereiro de 2011
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Ave Cesar da Blogosfera!
ResponderExcluirMeu "particípio morrendo" saúda o seu
"gerúndio vivido"! E se atira "de peito aberto"... "sobre a lâmina afiada da noite."
Abração
Pastor de perguntas
ResponderExcluirMancas, erradias,
Desgarradas das trilhas
Dos costumes....
Loucutor de mensagens cifradas...
No alto de mim guarda de trânsito multando-me os sonhos...
O máximo, Marquinho!
Sim, os três, coisas grandes, grandiosas... Aliás, hoje estou assim sem palvras, mas assombrada. É uma expressão singular e provocativa sempre a sua.
Beijos
Marcantonio
ResponderExcluirFevereiro é um mês especial para mim: num fevereiro minha mãe nasceu; num fevereiro, minha mãe partiu... E, sobretudo, num fevereiro nasceu-me um dos filhos. Todos os três significativos acontecimentos, em dias vizinhos (no inicio do mês). Sendo assim, este período deixa-me muito, muito sensível.
"Três Poemas No Início de Fevereiro"...
Nenhuma palavra, senão: BRAVO!
Enorme abraço, amigo!
ão bem decifras os sinais da esperança e do medo, os sinais que surgem no horizonte quem sabe da alma a se misturar no céu, no planalto do olhar. Só o homem mesmo para se perder nessa "absoluta síntese" da existência e sim acho que por vezes é patético o modo como as escolhas são completamente mal pensadas, sem escolha, sem consciência. Os anjos, do filme que observam tudo de lá de cima sabem o quão tudo passa, o quão não vale a pena a violência, o quão somos pequeninos.
ResponderExcluirBeijos
Esperança e medo é de um lirismo exemplar, provocativo mas cheio de suavidade. Sopro benfazejo de poesia em alto grau. o Planalto também é altíssimo, o 'olho de pássaro' é agudo. Suspensão de juízo fecha com uma gramática de viver,
ResponderExcluirabraço
olha, sujeito danado, nenhum predicado que eu disser estará à altura da sua oração soberana.
ResponderExcluirsou mestra em suposições mas afirmo categoricamente: você não é poeta, você é O POETA.
admiro-te e muito.
beijo, meu mago!
Poetas e suas eternas sínteses do infinito.
ResponderExcluirBelos dizeres, meu caro!
Beijo.
o primeiro poema ficou impecável! parabéns.
ResponderExcluirabs
Do alto de mim
ResponderExcluirObservo-me:
Severo espectro
Com olho de pássaro
Adicto ao mundo.
que verso!
verso que define a caricatura ideal de um anjo ou um poeta.
o filme de wenders é o meu eleito, por toda a visão que ele nos induz.
e eu completaria o quadro entre você, os versos e os anjos do filme com:
Toda essa seiva de sol sempre nascente,
Inoculada nas minhas veias viciadas
No fluxo mortiço das horas nubladas,
Talvez signifique que este súbito apego
À vida jamais se oxidará no meu corpo.
seu trabalho é de imagens
as palavras trabalham para você.
beijo.
Marco, fevereiro começa ótimo com a leitura dos teus poemas, que, verdade, não sei dizer qual destacar porque excelentes.
ResponderExcluirÉ melhor senti-los e calar.
Abraço forte e que venham os outros meses.
e quanto mais vejo menos quero ver
ResponderExcluirfelizes daqueles que caminham cegos entre a multidão
não somos desses!
Beijos
Laura
O início de fevereiro diz coisas tão belas que é preciso ler e reler. Poema bom é assim: convite à releitura, e cada uma delas revela alguma beleza que não se descobriria de outro jeito. Uma delícia total, Marco.
ResponderExcluirBeijo.
Poetíssimo!
ResponderExcluirComo destacar um entre três belos?
Fevereiro já está marcado pelos teus belos poemas.
"É por tanto que temo que esse encontro
Embriagado da aurora com o crepúsculo,
Se atire de peito aberto, suicida precoce,
Alucinado, sobre a lâmina afiada da noite."
O filme...Bárbaro!
Beijos, poeta!
Mirze
Com quantos anjos se faz um homem? Com quantos pássaros se faz um marcandoido? Com quanto gosto uma bípede lê os seus poemas ?
ResponderExcluirbeijos :)
Marcantonio, amanhã, dia 11, aniversário de 1 ano do Mínimo Ajuste. Vai lá assoprar a velinha :)
ResponderExcluirbeijos
BF
fevereiro, o mês breve, das palavras longas e dos desesperos de neve. rolam os seus dias, gostos, por gargantas que os amolam e apontam para as grandes indefinições de pleno-dizer, de quase desvela-ser.
ResponderExcluirde megafone em punho, todas as coisas se tornam possíveis. e o nunca torna-se apenas arcaismo... mesmo fora do verso.
abraço de fevereiro!
Poeta.
ResponderExcluirDos grandes.
Nada mais a dizer.
bjs
Rossana
Existem certos amores, que permanecem como diamantes encrustados em nosso coração.
ResponderExcluirA ansiedade de reencontrar, a vida vivendo já, antes do tempo..... ah.... o amor!
Não sei qual o melhor dos três- difícil escolher. Um bem haja à sua poesia. Abraço.
ResponderExcluirDos três, os três. Ótimos, todos. Abraços!
ResponderExcluirTer alguém "engastado" em meu peito é o que eu mais queria.
ResponderExcluirMas do alto de mim mesmo sou multado pela absoluta falta de sonhos.
Restam os bons filmes e os pronomes indefinidos.
Belos e expressivos poemas!