CANTOCHÃO
É tão breve o eco das antífonas em meus ouvidos.
Não têm o rumor de mil garças alçando vôo
Após a salva de tiros de timbales,
Mas o chiado ardido
De uma rocha ígnea afogando-se num lago.
Não invejo os que ouvem o coro dos anjos
Porque beatificam a dúvida
E não sabem se o retiram de si mesmos
Como quem vê vazar o sangue dos próprios
Pulsos
E o estranha como a um desconhecido.
Meu coro angelical é essa salmodia de pássaros
Urbanos
Saudando a dessacralização da tarde
Sem que eu possa vê-los como arautos exilados
Ou como escravos bardos de uma elegia,
Tão natural é sua lida com a luz real do dia,
Aquela que lenta se transmuda, térmico relógio.
Não sei se retiro de mim, víscera que não estranho,
Essa concretude profana da tarde, banal tarde;
Mas dentro dela, verdadeiro, fico muito à vontade.
LARGO
É tão serenamente que Proserpina
Sobe à superfície da terra,
Tão logicamente,
Tão maquinalmente,
Tão inexoravelmente!
Nada da humana ansiedade
De evadir-se da escuridão.
Como são impacientes as lâmpadas
Que querem cegar os olhos da noite.
De outro modo,
Uso óculos escuros ao dia
Para me afeiçoar ao meu destino.
domingo, 7 de agosto de 2011
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Dois excelentes poemas, Marquinho...Largo é fabuloso! Humano seria correr a descer ao reino de Plutão com desenvoltura? pergunto-me. Os óculos escuros, que me vestem sempre, agora sei: também ensaio o meu destino!
ResponderExcluirBeijos,
óculos escuros com arranhões
ResponderExcluirserão esperança e tardia insônia
(mas é dia, mas que dia
se da luz se faz a noite)
...
forte abraço,
camarada.
(poemas majestosos)
Essencial o óculos escuro que não nos cegue a vista já cansada. Poesias maravilhosas, como sempre! Beijos!
ResponderExcluirachei o primeiro poema com uma pegada forte.
ResponderExcluirconheci hoje e gostei daqui.
um abraço
Escurecer o dia
ResponderExcluirpara clarear a noite...
Bejinho com admiração!
Difícil o escuro. Difícil a claridade. E difícil escrever como você escreve!
ResponderExcluirbeijoss
Marco!
ResponderExcluirSenti uma ligação forte entre os dois poemas. O angelical, dessacraliza a tarde.
O sangue que vaza é de outrem.
Usemos óculos escuros que embaçam a verdade!
Beijos
Mirze
marquinho,
ResponderExcluirde seus relapsos amigos, eu sou, certamente, o mais envergonhado de todos.
e perco tanto, enrolado, amaranhado em tanta coisa, que nem vale a pena chorar as pitangas.
tenho saudades imensas de ver aqui, de ler suas coisas, de dar meus pitacos.
prometo que melhorarei.
"TUDO da humana ansiedade
De evadir-se da escuridão"...
vou emergir. ja sinto a brisa da manhã levantando o topete.
beijo grande do
roberto.
Um espaço soberbo.
ResponderExcluirCarregado de bom gosto.
Nesta postagem a música se funde entre a poesia que também é melódica.
Gostei demais.
Abraços
Amei esse Cantochão! E a música de Handel valoriza os poemas. Em suma: tudo maravilhoso.
ResponderExcluirBeijo pra você.