Como ter a disponibilidade criativa e lúdica de um anônimo construtor de castelos de cartas que se submete apenas às injunções do próprio medo (sagrado medo!) de que eles desabem diante dos seus próprios olhos?

domingo, 22 de maio de 2011

Dois Poemas Fora de Hora

MENSAGEM

Meu amor,
Deixo aqui um grande fardo,
Depois em silêncio aguardarei.
É tudo tão simples
E nos enganavam:

Nunca se tratou da botânica,
Mas da flor particular
Que contivesse um universo
Sem esperas.

Não era a arquitetura,
Mas a casa,
Qualquer casa arejada.

Jamais foi a lingüística
Ou a gramática,
Mas a palavra,
Célula da carne dos anjos
Que nada nomeava.

E nada fora arte,
Senão as linhas
Das palmas de nossas mãos
Que não são cartas náuticas.


REVENDO

À vezes a palavra
É marca d’água
Nas fibras do papel,
Faz-se ruga úmida
No deserto sem cor.

Se a mesma palavra
Escrita for falada,
Será como peixe
Que salta na água
Das mãos do pescador.

Mesmo que renove
O anzol e a isca,
Não sabe à risca,
Se pescará a arisca
Que antes lhe escapou.


15 comentários:

  1. Marquinho,

    É fatal a arte.manha da tua escrita. Dela, nem coração nem olhos escapam.

    Lendo teu Diário descubro os segredos escondo em mim.

    beijinhos...

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  2. Genial Marco, a história da linha das mãos, o peixe que se perde, a isca e o anzol. genial!

    bjs

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  3. cartas náuticas, marcas d'água, de uma ou outra maneira as incrições estão em busca de códigos de leitura,


    abraço

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  4. Interessantes colocações das palavras, estas que nos escapam às vezes, mas não nos abandonam.

    Beijo.

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  5. e estamos sempre pescando
    com os olhos distantes
    dentro d'água
    ...

    forte abraço,
    camarada.

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  6. Revendo...maravilha de poema! Ambos chegados na hora certa, como sempre chegam, e dizem do que eu não soube dizer, mas me cabem tão bem, impressionante!

    abraço, Marquinho!

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  7. Dois poemas em hora mais do que certa, meu caro, com direito a quiromancias que norteiam, e ótimas palavras salteiras. Forte abraço.

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  8. ah Marco!

    Não posso negar que tenho meus arrombos de 'poesia panfletária', mas no íntimo não me engano, a poesia é totalmente inútil. E é por ser inútil mesmo que serve a nós, preenche o que há de humano em nós.

    Espero ansioso por uma publicação sua em livro meu camarada.

    Um abraço!

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  9. as palavras estão aí fora das horas que nos entram filtradas. palavras são peixes pescados a mão.

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  10. Encantada...
    Soa o verso como canção... Canção de amor..

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  11. POETÍSSIMO!

    Poemas na hora exata, para que percebamos a pele, a alma e a linha da sua escrita fantástica.
    Como no vídeo, o cuidado com a chama, a palavra, a ânima!

    EXCELENTE!

    Beijos, poeta!

    Mirze

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  12. "Mesmo que renove
    O anzol e a isca,
    Não sabe à risca,
    Se pescará a arisca
    Que antes lhe escapou."

    Que versos ótimos, camarada!
    Por isso, há vezes que devemos pescar poesia com redes de arrasto!
    um grande abraço!

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  13. Apenas palavras,
    nenhuma certeza

    mas se traduzida
    em gestos, fala...
    fica gravada

    mas nenhum apego,
    ainda não garante nada

    Abraço!

    Marlene

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  14. PS: nostalgia! dei o filme de presente para um grande amigo, professor de filosofia da UFF. puxa, que filmaço!

    os versos, sinceramente, belos de uma forma que assusta, pois sempre são bons e tão cheios de imagens fantásticas...

    por exemplo:

    E nada fora arte,
    Senão as linhas
    Das palmas de nossas mãos
    Que não são cartas náuticas.

    cartas náuticas nas linhas da mão? marco! como faço para esquecer tal imagem e não roubá-la sem querer em verso futuro?

    as vezes eu não gosto de ler poetas.


    um beijo.

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