Como ter a disponibilidade criativa e lúdica de um anônimo construtor de castelos de cartas que se submete apenas às injunções do próprio medo (sagrado medo!) de que eles desabem diante dos seus próprios olhos?

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Quatro Novos Poemas

SAUDADE

Dias alquebrados,
Céus comprimidos,
Noite engavetada,
Estrelas prepotentes,
Sono preterido.

Chuva sem som,
Abismos os braços,
Escadas estáticas,
Janelas asmáticas,
Ar sem espaço.

Espelhos visitados,
Relógio crescente,
Parcelas, subtrações,
Artéria convulsiva,
Fome inconsciente.

Cisternas ao relento,
Sombras no assoalho,
Outras fotografias,
Cascas de poesia
Que recolho espalho.

Propagar-me em vão,
Queimar sem luz,
Transpor portais
Com ânsias postais
Carregando a cruz.

Vírgula, dois pontos,
Eqüidistância clara,
Formas inalteráveis,
Frases inabitáveis
Na boca que calara.


PONTO-PARÁGRAFO

Meus lábios atrevidos,
Na tua boca entreaberta,
Concluirão previdentes
Com beijos emudecidos,
A tua fala incompleta.


MY FAIR LADY

Meu beijo
Um sopro,
E o teu peito ofega,
Galathea que dormia
Na pedra.


ANTES DE EXISTIR

É impossível dizer positivamente
o que quero
Desde que não posso retornar
Ao nada,
Ao nulo,
Ao marco zero.



Cena do filme "A Cor da Romã" (1968) de Sergei Paradjanov

11 comentários:

  1. obrigado, meu camarada,
    pela magia que sopras

    e ainda nos trazes
    o pequeno monge

    a cuidar dos livros
    não dos queijos
    ...

    forte abraço.

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  2. rapaz, gostei do marco zero. Dessa principietude (isso existe) plena de amanhecimentos,


    grande abraço

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  3. Tanta boa poesia em um só post. Galathea na pedra, o marco zero. Saborosa a leitura deste seu diário!

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  4. não sei o que será pior, se a saudade, se a presença; se a noite, se o dia.
    Beijo
    Laura

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  5. Marcantonio, você anda escrevendo tão tão bem que chega a ser uma maldade! :)
    beijo

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  6. putz Marco,

    muito bons os poemas, o trecho do filme também. Ótimo para quem lê e não ouve!

    um abraço!

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  7. Tudo muito lindo...agora...o ponto-parágrafo é de deixar a boca entreaberta mesmo rs.

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  8. Na sua métrica de ritmo perfeito me al(l)quebrei.

    Ótimos poemas, Marco!

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  9. Corpos e palavras a se misturarem. Sempre de parabéns, Marcantonio. Antes de existir e Saudade me cativaram bastante. Abraços!

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  10. Poetíssimo!

    Excelentes poemas, onde "SAUDADE", me ligou ao "MARCO ZERO", ou seja, se você como poeta não existisse, seria essa a saudade da boa poesia.

    PARABÉNS!

    Beijos

    Mirze

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  11. saudosa estou daqui.
    Meu carinho, Marco.

    teus versos são ondas de mar que me quebram e me refazem sempre.
    Beijos

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