Há dias, na casa de amigos queridos, assisti ao primeiro filme do "Decálogo" de Kieslowski. Fascinante. Na noite seguinte, ao passar pelo canal Futura, reconheci imagens de alto teor poético: estava sendo exibido A Dupla Vida de Véronique. Não fiz pouco caso da coincidência e assisti uma vez mais a esse filme belíssimo. Dizer que aprecio o cinema de Kieslowski seria pouco. Seus filmes me deixam num estado de alerta estético, pois cada imagem parece ocupar o lugar de uma palavra num poema; há sutilíssimos vínculos que podem ser descobertos a cada exibição. E desconfio que poderia assisti-los com prazer partindo de qualquer cena, pois é mais uma questão de sentir do que propriamente entender, e sempre temos a sensação de sermos arrebatados por uma atmosfera integral, profunda. Poesia, metafísica, sentidos flutuantes que podem se inverter subitamente ao mapear as relações dos seres humanos entre si e com os "mistérios" de um mundo tomado por objetos nunca banais.
O filme trata da inquietante noção de duplo. Duas mulheres (interpretadas por Irène Jacob) aparentemente iguais, uma polonesa, Weronike; a outra francesa, Véronique. Ambas lidam com música e têm a estranha sensação de que jamais estão sozinhas. Acompanhamos, a princípio, a vida da polonesa que morre de um ataque do coração em plena apresentação como solista em um concerto. Neste ponto a ação muda para a França, onde a vida de Véronique parece mudar de rumo.
A trilha sonora do filme, composta por Zbigiew Preisner, inacreditavelmente bela, se torna também personagem e atinge um climax maravilhoso na cena da morte de Weronike. O compositor foi colaborador assíduo de Kieslowski.
Em uma dessas estranhas sincronicidades tão caras a ele, Kieslowski também morreu de ataque cardíaco em 1996.
Abaixo, a cena da morte de Weronike e, em seguida, o belo trecho das marionetes, espécie de intermezzo poético que mostra de maneira simbólica a morte no palco e um renascimento, além de dar início ao interesse de Véronique pelo misterioso performer e escritor.
Adoro a Irene Jacob. Já coloquei no Mínimo Ajuste uma imagem dela no cabeçalho, a do A Fraternidade é Vermelha!
ResponderExcluirGosto demais do Fraternidade é Vermelha. Aquela idéia sobre o juiz que ouve a conversa dos vizinhos é extraordinária.
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