Como ter a disponibilidade criativa e lúdica de um anônimo construtor de castelos de cartas que se submete apenas às injunções do próprio medo (sagrado medo!) de que eles desabem diante dos seus próprios olhos?

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Mínimos Múltiplos Comuns


1- efeito colateral

Classificar um rio como PERENE,
é como fazê-lo parar.
E se o dizemos TEMPORÁRIO,
infundimos em sua águas
o desespero de chegar.

2- quem me prometeu?

Quem irá me atar
ao rochedo de meu destino
sob um céu isento de abutres?

Enquanto aguardo
construo, com fogo e medo,
um simulacro.

3- bem sorrir

Se me levarem a sério,
me farão gargalhar.
Quero apenas mostrar
os meus dentes externos
ternamente.

4- vagabundear

A pretensão nos impõe
carregar um fardo desnecessário
já largado por outro
no meio da estrada.

Mas a despretensão vagabundeia,
leve,
olhos postos na beleza do chão.

5- sem racionamento

A imaginação é uma torneira
aberta em todas as residências.
Mas muitos não toleram seu forte fluxo
e os inevitáveis respingos:
pensando no preço a pagar,
adotam um triste racionamento.

















Monotipia s/ Título - Marcantonio

6 comentários:

  1. Teus 'mínimos' são máximo com todas as palavras, pensamentos e obras. Em tudo nascente, foz e fluxo e, em meio a tido, a inquietude e a agonia do viver e da espera.

    Muito, muito bom!
    A Arte na arte, inclusive.

    abraços

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  2. Marquinho, o vagabundear ( me empresta?) é a mensagem urgente pra muita gente, e esse "olhos postos na beleza do chão"...ora, ora...é o estar aberto para o imprevisto, o imprevisível, que muitas vezes é tão-somente o que já está visto sem ter sido olhado.
    Ah, meus olhos vão lá pra o seu perfil, infiel, porque a sua poesia arrebata num segundo. Estava aqui de olho, esperando um post: bem-vindo!

    Abraços ( e agora vou reler, porque rumino o que gosto).

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  3. Mai, que bom que você comentou aqui. A minha pretensão é mínima por razões puramente egoísticas e dietéticas: quero me manter leve e livre. Claro que a alegria de reverberar na alma alheia existe; e como!É uma troca fundamental, por exemplo, quando essa sua percepção de que é tudo "a inquietude e a agonia do viver e da espera" reverbera em mim. Tentemos fazer com essa inquietude algo belo!

    Abraço.

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  4. Tânia, a sua análise sobre a possibilidade do imprevisível é perfeita. Acostumamos nossos olhos à rotina de ver antes de olhar. Esse 'olhar' de uma forma ampla, com todos os sentidos. No cotidiano há infindas janelas abertas. A mais descabida pretensão, no fundo, está no supor que tudo já foi visto.
    Uma confissão: também rumino os seus comentários.

    Abraço.

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  5. poesia mínima é sempre pulsante, concentrada, embriaguez em dose única. abraço

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  6. Assis, você entrega poesia em domicílio? Volte mais vezes, poeta.

    Abração.

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